domingo, 10 de agosto de 2008

SERVIÇO PÚBICO I

Um querido leitor do nosso blog enviou-nos um e-mail pedindo que o publicássemos, alegando que o BACHARÉIS EM BAIXARIAS seria o veículo ideal para a exposição de um problema que viveu enquanto estava concluindo seus estudos em Letras no ano de 2005. No intróito do referido e-mail ele faz um desabafo, dizendo que, por falta de coragem e de obstinação, desistira de levar adiante um projeto de estudo acadêmico que pretendera desenvolver acerca do tema PALAVRÃO. Tema do qual, segundo ele, provocaria sérias controvérsias na instituição, e que poria até em risco sua credibilidade como futuro pesquisador. Logo após, no mesmo e-mail, ele segue com a transcrição de uma carta-declaração que, na véspera da ocasião da defesa da referida pesquisa, apresentara à direção do curso desistindo de continuá-lo, seguida de um resumo do que seria o tal nefando estudo. Que segue:

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DECLARAÇÃO

Eu, Alexandre Coimbra Gomes, graduando do 4° ano de Letras desta Veneranda Instituição, e futuro professor de Língua Portuguesa e suas Literaturas, acuado diante do risco de sofrer uma esculhambação geral por parte dos ilustres companheiros de ofício (e, também, propagadores do bom uso e do amálgama da nossa Língua ), desisto desta lamentável apresentação sobre “o palavrão” e declaro recuar, como um pobre-coitado, a fim de defender minha reputação perante vocês.
Sob o risco de incorrer em uma pesquisa espúria, em que “o tiro poderia sair pela culatra”, assumo que vali-me de total pudicícia para tomar tal resolução.
Livro-os deste aperitivo de mau gosto do nosso ramo, evitando, assim, algum tipo de encrenca.
Aqui fica meu testemunho.
Por favor, não fiquem enfezados comigo.
Peço desculpas,
Alexandre Coimbra Gomes

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E o e-mail continua assim:

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Querido Reitor, o resumo do referido projeto consistiria , após apresentá-lo como ante-projeto, No desrespeitoso e absurdo tema que segue:

Português Culto x Português Vulgar :- a importância e o uso do chulo pelos cânones literários em suas obras .

O presente trabalho pretende, livrando-se dos tabus que sempre cercearam estudos de tamanha relevância, redimensionar o quão necessário foi, e é, a importância dos palavrões para os autores da literatura de língua portuguesa, ditos canônicos, como forma de expressão, discutindo assim a utilização da linguagem chula , popular pela linguagem erudita ( e sua literatura ).

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Neste blasfemo estudo, Senhor Reitor, antes de dar início à pesquisa propriamente dita, eu pretenderia ( Olha que atitude mais ingênua e anti-acadêmica da minha parte!) corroborar uma suposta importância científica acerca do tema PALAVRÃO a partir de citações ( que eu denominara idiotamente como “Palavrinhas sobre palavrões”) como as a seguir:


“ Em ciência não há problema moral: qualquer pesquisa é válida desde que os objetivos sejam científicos”
DINO PRETI –(professor da USP no livro “A Linguagem Proibida”.)

“Não vulgarizemos o palavrão (...)o palavrão há de constituir zona de segurança, um refúgio a ser utilizado (...), quase in extremis. Se banalizá-lo, na hora do sufoco vai-se usar o quê? Tiros, certamente.”
SOARES FEITOSA –( escritor , em entrevista ao site Jornal de poesia)

“ O palavrão para o escritor burguês abre as portas para que se discuta com mais propriedades determinados temas qua são tabus, (...)sem luvas de pelica.”
SILVIANO SANTIAGO – (escritor em entrevista sobre o seu livro “O Falso Mentiroso”)

“ (...) o primeiro ato civilizatório teria ocorrido quando, em vez de responder ao impulso de eliminar fisicamente a alguém que o tenha desagradado, o ser humano pré-histórico xingou aquele outro”
SIGMUND FREUD – (o pai da psicanálise, no livro “O mal estar da civilização”)

“ A alegação de algumas palavra são tão deletérias a ponto de não poderem ser escritas é usada em todas as tentativas de impedir a liberdade de expressão (...).”
RUBEM FONSECA – (escritor, no conto “Intestino Grosso”)

“ O palavrão é fundamentalmente necessário como meio de descarga emotiva. Não é apenas uma palavra, mas um campo magnético no qual o sentido é secundário em relação às suas linhas de força. ”(...) “ (...).o português é uma língua pobre em palavrões. Muito rico é o espanhol, que possui o maior número e os mais eficientes. O italiano não fica muito atrás, inclusive com uma grande variedade de blasfêmias. A mais pobre é o alemão. Talvez por isso, de vez em quando, os alemães precisem de guerras .”
HALMILCAR DE GARCIA – (dicionarista e coordenador brasileiro do dicionário Caldas Aulete, em entrevista a Edilberto Coutinho, revista Fatos e Fotos Gente nº 735/1975)

“ Imaginad lo que pasaria em medicina si los médicos negaram atención a muchas inmundicias ( físicas y morales) que tienen que considerar”
DÁMASO ALONSO – ( psicanalista chileno, citado por Camilo José Cela, em Diccionário Secreto)

“ (...) as sociedades ambiciosas detestam temas escatológicos e vivem obcecadas com eles”
NORMAN MAILER – (escritor americano, na introdução do livro Erotismo na Literatura Brasileira, citado pelo dramaturgo Agnaldo Silva)

“ O palavrão é elemento útil para a caracterização do ethos de uma sociedade ou das constantes de uma cultura ou da identificação de um tempo social.”
GILBERTO FREYRE - (autor de casa Grande e Senzala, no prefácio do livro “ Dicionário do Palavrão e termos afins”.)

“Não é qualquer um que consegue usá-lo ( o palavrão) bem; seu emprego é uma arte”
ODUVALDO VIANA – teatrólogo, ao Diário de notícias em 14 de outubro de 1967.

“(...) falar palavrão é coisa séria, muito mais séria do que se imagina. (...) O palavrão deve ser usado como um sentimento muito forte de injúria. Para mim, usar um palavrão fora de hora é como marido e mulher irem a um motel. O motel foi feito para os amores clandestinos. Fazer amor legal no motel? Ora, faça-me o favor!”
JOSÉ PAULO PAES – (poeta e escritor brasileiro em entrevista para a Veja, em 3 de abril de 1986 )

“ (...) a raiz latina de pudenta – os nossos genitais – significa ‘ envergonhar-se`. ficamos divididos entre o pudor e os abençoados prazeres do corpo, vivendo em meio a uma proliferação de imagens sexuais que nos causam ao mesmo tempo prazer e vergonha.”
SALLIE TISDALE – ( do livro “Sussurre coisas eróticas pra mim”de 1985)

“Os palavrões possuem um poder de gerar alucinações, já que provocam a representação da cena sexual,das secreções e dos fuidos corporais, ou do órgão de uma forma clara à realidade”
ARIEL ARANGO – ( psicanalista argentino no livro “As virtudes terapêuticas dos palavrões “.)

“A linguagem obscena, ou seja, os palavrões, seria transgressora , em alguma medida, por rebelar-se contra o engessamento emocional, promovido pelo que se convencionou chamar de “ bons costumes” (..) com isso, a linguagem obscena se presta a promover a liberação da agressividade, às vezes representando ela mesma a agressão”
PAULO BESSA DA SILVA ( professor da UMESP no artigo “ linguagem obscena”)

“(...) mas não adianta consultar dicionários. em inglês, como em português, os dicionários continuam pudicos por princípio e atrasados por motivos técnicos.”
MILLÔR FERNANDES – ( jornalista e escritor, in epígrafe do livro Dicionarinho do palavrão e correlatos” de Glauco Mattoso, em 1990)

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A partir daí, Senhor Reitor, é que eu finalmente analisaria os seguintes poemas:

Em face dos últimos acontecimentos

Oh! sejamos pornográficos
(docemente pornográficos).
Por que seremos mais castos
que o nosso avô português?
Oh! sejamos navegantes,
bandeirantes e guerreiros
sejamos tudo que quiserem,
sobretudo pornográficos.
A tarde pode ser triste
e as mulheres podem doer
como dói um soco no olho
(pornográficos, pornográficos).
Teus amigos estão sorrindo
de tua última resolução.
Pensavam que o suicídio
fosse a última resolução.
Não compreendem, coitados,
que o melhor é ser pornográfico.
Propõe isso ao teu vizinho,
ao condutor do teu bonde,
a todas as criaturas
que são inúteis e existem,
propõe ao homem de óculos
e à mulher da trouxa de roupa.
Dize a todos: Meus irmãos,
não quereis ser pornográficos?

( Carlos Drummond de Andrade)


9 CENSURADO [1999]

Sabendo que a censura não me trava,
pediram-me um soneto sem calão
pra pôr na antologia de salão
que o tal do [censurado] organizava.

Queriam até tônica na oitava,
mas nada de recurso ao palavrão.
Usei o ingrediente mais à mão,
porém sem [censurado] não passava.

Desisto. Quanto mais remendos meto,
mais roto vai ficando o [censurado].
Poema não é texto de panfleto

pra ter que se estampar todo truncado!
Pois esta [censurado] de soneto
que vá pra [censurado] [censurado]!

(Glauco Mattoso)


100 PROIBIDO

Tabus são mui comuns em todo o mundo.
Na China não se pode ter irmão.
Em Cuba, ser de esquerda é obrigação
e, nos States, nada está em segundo.

Não deve um escritor ser tão profundo
a ponto de ocultar toda a intenção;
Nem é-lhe permitido o palavrão,
a fim de não ferir o pudibundo.

Em suma, se correr o bicho pega,
se fica o bicho come, não tem jeito.
Mas cego que é poeta não se entrega:

Se não existe fama sem proveito,
já basta o que a cegueira me sonega!
Sou chulo e reconheço meu defeito!

(Glauco Mattoso)

Portanto, Senhor Reitor, neste ato de claro arrependimento, venho por meio desta, pedir o redirecionamento do objeto do meu estudo para outro em que sua nobreza de tema faça juz à seriedade dessa instituição.

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Alexandre, nós os Bacharéis em Baixarias lemos e publicamos, como vê, todo o seu e-mail, mas gostaríamos de fazer algumas observações acerca justamente do tema que você, por critérios pessoais, desistiu de continuar a pesquisar (e que respeitamos o ato). O Reitor e os Professores desta “Veneranda Instituição” após terem lido a sua “DECLARAÇÃO”, acataram o pedido e até disseram terem adorado texto, como você nos disse. Mas nós os Bacharéis somos, como pode evidentemente perceber, especialistas em perceber baixarias nos mais recôndidos, obscuros e eruditos meios intelectuais. Esse é o nosso verdadeiro papel. Lamentável que o tal Senhor Reitor e os Venerados ( ou Venerandos? Sei lá, já me confundi com essa baboseira toda) Professores tenham concordado que você tivesse que se distanciar do tema palavrão, tenham lido e gostado do texto da sua DECLARAÇÃO e não tenham percebido algo importantíssimo: SUA DECLARAÇÃO ESTAVA REPLETA DE PALAVRÕES! Isso mesmo rapaz!Sem querer vocês pregou-lhes uma peça. Após termos feitos minunciosas análises etimológicas de cada palavra, verificamos que, na hipocrisia dessa atmosfera acadêmica, todos acabaram aplaudindo, sem perceber, justamente o que estavam rejeitando.

Acompanhe as palavras numeradas do seu elogiado texto e veja a análise a seguir;

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DECLARAÇÃO

Eu, Alexandre Coimbra Gomes, graduando do 4° ano de Letras desta Veneranda Instituição, e futuro professor de Língua Portuguesa e suas Literaturas, acuado[1] diante do risco de sofrer uma esculhambação[2] geral por parte dos ilustres companheiros de ofício (e, também, propagadores do bom uso e do amálgama[3] da nossa Língua ), desisto desta lamentável apresentação sobre “o palavrão” e declaro recuar[4], como um pobre-coitado[5], a fim de defender minha reputação[6] perante vocês.
Sob o risco de incorrer em uma pesquisa espúria [7], em que “o tiro poderia sair pela culatra”[8], assumo que, vali-me de total pudicícia[9] para tomar tal resolução.
Livro-os deste aperitivo[10] de mau gosto do nosso ramo[11],evitando, assim, algum tipo de encrenca[12].
Aqui fica meu testemunho[13].
Por favor, não fiquem enfezados[14] comigo.
Peço desculpas,
Alexandre Coimbra Gomes

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Alexandre, nós do Bacharéis em Baixarias verificamos que etimologicamente as palavras grifadas têm as seguintes origens:

[1] - acuado - do Latim “ proteger o próprio rabo”, colocar o c* contra a parede.

[2] - esculhambação - a etimologia identifica na palavra derivada do grego “koleión” , evoluindo para “colhões”

[3] - amálgama - remete a “coito” em árabe antigo

[4] - recuar – do Latim “ apontar para a região traseira”, ir em direção ao c*.

[5] - coitado- do latim “coitus”.

[6] - reputação - “do latim “puttare”

[7] - espúria - Plutarco (50-120d. C) dizia que o adjetivo ‘spurius” deriva de uma palavra Sabina para a genitália feminina.

[8] - culatra - termo bélico “culatra” do latim “culus”, “ parte de trás do canhão, ânus”

[9] - pudicícia -“pudico”e “impudico” vem de “podex”,como os romanos chamavam o ânus.

[10] - aperitivo- “aperitivum” era termo médico na Antiguidade que significava “purgante”

[11] - ramo – do latim “ramu”, já foi “membro viril” na península ibérica.

[12] - encrenca - vem do iídiche “ein krenke” que significa “ ter doenças venérea”

[13] - testemunho - - “testimonium”, do latim, vem de “testi”, sobretudo no plural testes: “jurar sobre os testículos”.

[14] - enfezados - tem a raiz no Latim “faeces”, ou seja; “estar encoleirado por fazer força para aliviar-se das fezes”


Não há de quer.

Disponha.

Olavo Sader ( Bacharel I )

5 comentários:

Anônimo disse...

O VELHO CONSERVADORISMO ACADÊMICO. VOU APROVEITAR ESSE MOTE PARA FAZER UM PROJETO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA NA MINHA FACUL. POSSO?

ERNANI

LETRAS UERJ

Anônimo disse...

texto grande e chato. ainda não pescaram a função de um blog? um blog eficaz é aquele que falça de assuntos do momento, de uma forma bem suscinta. guardem essas divagações para lerem na puta-que-pariu!

fui!

adão

kiko disse...

jah tentaram o comércio? tem uma lojinha aqui q tah precisando de pessoal...rsrsrr

Anônimo disse...

A inveja é uma merda, né anônimo II e Kamisas com K. rsrsrsrsrsrsrsrs, kakakakakakakakakakaka, hehehehehehe!

takirapaepke disse...

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